Estudo para fachadas lateral e frontal, 1909
Início do projecto 1909
Quando um arquitecto projecta para si próprio, distante dos conflitos de gosto e dos compromissos de outros clientes, tem a possibilidade de manipular com uma segurança mais operativa algumas questões centrais da arquitectura. A casa do arquitecto transforma-se assim, não apenas no espelho das suas convicções sociais, mas também um momento de manifesto disciplinar. E, quando à casa se associa o atelier, a obra transforma-se no exemplo onde o arquitecto recebe os clientes, uma espécie de mostruário em directo da sua competência.
Na Casa Atelier, a convivência regrada e ambígua com o palacete Lopes Martins é a primeira demonstração perceptível, provocando a presença de uma nova escala doméstica nas formas urbanas da Praça do Marquês. Essa domesticidade é explícita assim que se ultrapassa a porta da casa, num hall com dimensões suficientemente generosas para se transformar numa sala de estar, com lareira, escadas cenográficas e aberturas amplas para o exterior.
No piso inferior estava instalado o atelier, com um circuito de ligação de serviço independente do serviço do piso superior, onde estavam instalados os quartos e os espaços mais reservados da habitação. O que a Casa Atelier demonstra com uma eficácia contundente, é a origem doméstica da prática dos arquitectos da Escola do Porto. O atelier, com acesso independente da casa para os colaboradores (através de uma pequena porta de serviço), está literalmente instalado no vão da escada e não tem porta para receber clientes. Essa ausência significa que o cliente de Marques da Silva habita a casa, é recebido no hall, no piso nobre e a dois passos da sala de jantar.
De um ponto de vista formal, a Casa Atelier é uma demonstração de virtuosismos e habilidades técnicas. Marques da Silva usou lajes mistas de madeira e betão armado, pedras de dimensões colossais em varandas, beirados recortados e saltitantes para exprimir um jogo volumétrico intenso. As várias soluções reforçam a expressão da materialidade do granito, evocando formalmente um eventual estilo românico, cujas formas eram da predilecção de Marques da Silva.
José Marques da Silva habitou este espaço sensivelmente entre 1914 e meados da década de 40, altura em que se transfere para o Palacete Lopes Martins, edificação contígua à moradia que passa para sua propriedade Aí virá a falecer em 6 de junho de 1947.
Já sob gestão da Fundação Marques da Silva, foi projetada a reabilitação da Casa-Atelier em dois momentos: em 2009, recuperação de fachadas, caixilharias e coberturas, e em 2013 a reabilitação dos espaços interiores.
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Bibliografia de referência
CARDOSO, António, O arquitecto José Marques da Silva e a arquitectura no Norte do País na primeira metade do séc. XX, Porto, Faup-publicações, 1997, pp. 536-539.
VASCONCELOS, Domingas, A Praça do Marquês de Pombal na Cidade do Porto, das suas origens até à construção da Igreja da Senhora da Conceição, Porto, Faup-publicações, 2008, pp. 117-118.
RODRIGUES, Ana Luísa, 1914 no Porto e em Viena: Duas casas, Dois arquitectos.
COSTA, Alexandre Alves, Inauguração da Casa-Atelier.
Localização
Porto, Praça Marquês do Pombal, 44
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